terça-feira, 31 de agosto de 2010

Regresso à base

Amanhã regresso ao trabalho, depois de um longo e merecido período de férias.
A lei diz que o ano judicial coincide com o ano civil, mas sinto que começa amanhã: o ano judicial começa em Setembro e termina em Julho.
Volto aos processos, à rotina do escritório e ao contacto diário com Magistrados e Colegas.
Porque amanhã é um começo lembrei-me daquilo por onde eu começo a formação: pelo princípio, a petição inicial.
Lembro-me daquilo que costumava recordar aos licenciados acabados de "aterrar" nesta profissão: o juiz não conhece a história, não conhece as pessoas nem as circunstâncias que levaram àquele litígio, pelo que o papel do advogado é contar a história de modo a que ele fique a conhecê-la.
Estando ali para dirimir o litígio de aordo com a lei e a sua convicção/consciência, é preciso que o juiz fique a conhecer a história e os seus intervenientes.
Mas não se contam factos irrelevantes, nem se discorre sobre o que não são factos, porque quanto mais "palha" se levar para um processo, mais se complica o trabalho do juiz e o processo, e não vejo vantagem nisso quando se pede uma justiça célere.
Costumo dizer que a petição inicial tem de ser escrita como se nos estivessemos a dirigir a uma criança de 6 anos. Não porque o juiz deva ser tratado como uma criança, mas porque devemos ser claros, não escrever "em círculos"...
Quanto mais simples for o modo como descrevemos a posição do nosso cliente, mais simples se torna ao destinatário da mensagem apreender que ele tem razão.
Creio que grande parte da arte de ser Advogado está na capacidade de síntese.
Muitas vezes essa necessidade de sintetizar o essencial é a primeira se não a principal dificuldade para quem acaba de vir da Faculdade, habituado a ter de discorrer sobre teses académicas em confronto e sobre todos os ângulos de abordagem de uma questão de Direito.

segunda-feira, 23 de agosto de 2010

Está bem o que acaba bem

Pontos de vista

Já repararam que as pessoas, de um modo geral, se dividem entre aquelas que valorizam a beleza e aquelas para as quais releva a inteligência?
Apercebi-me recentemente de que há pessoas que, ao elogiarem alguém, utilizam expressões como "bonita, agradável, gira". Outras pessoas, quando entendem haver motivo para elogiar, utilizam expressões como "é uma cabeça", tem raciocínio rápido, ou apenas que é uma pessoa em quem se pode confiar.
O que é engraçado é que aqueles que elogiam a aparência não costumam atender a questões de intelecto ou personalidade. Apenas interessará a aparência?
Aquelas que acham que aquilo que deve ser elogiado é a inteligência ou a personalidade costumam ignorar aspectos "visuais". Farão mal?
É provável que seja assim porque cada um elogia nos outros aquilo que valoriza em si próprio. Ou porque foi educado assim.
O facto é que dou por mim rodeada de pessoas que, ao falar de alguém, dirão que "é estúpido que nem uma porta ondulada" ou "tem uma grande cabeça", conforme o visado.
Não costumo ouvir dizer de alguém que é "giro/a" ou que "é feio/a como uma noite de trovões"...
Certamente que se eu tiver alguma coisa a elogiar nem me lembrarei se a pessoa é alta, magra, baixa ou gorda. Mas lembrar-me-ei de certeza se tem a coluna vertebral alinhada ou se é capaz de exprimir o pensamento em termos adequados.
Talvez por isso eu pareça (seja?) tão antipática quando me apresento aos formandos: não estou ali para que gostem da minha aparência, estou ali para ensinar e formar, e isso eu sei fazer.

sexta-feira, 20 de agosto de 2010

Mentiras de quem interessa

Tenho fama de ter mau feitio e admito que às vezes tento ter o proveito respectivo.
Porém, essa fama deriva do facto de eu ser frontal e não ter "papas na língua", o que leva a que eu nem sempre seja politicamente correcta.
Pode haver muitas explicações para eu ser assim, mas suponho que a principal assenta na circunstância de eu não tolerar a mentira ou a dissimulação, e não as tolerando nos outros obviamente que não as admito em mim própria.
Quando vejo a frase anterior escrita assim, até parece uma frase banal. :)
Mas sou incapaz de encontrar palavras que descrevam a que ponto eu fico transtornada quando apanho alguém a mentir (alguém que interesse, como é evidente).
A mentira deixa-me fora de mim, "tira-me completamente do sério".
Tenho no meu curriculum várias omissões, todas com o intuito de poupar alguém a um facto desagradável. Mas não há ninguém que possa dizer que me apanhou a mentir.
Perdi muitos amigos ao longo da vida, por ser assim, e perdi uma amiga recentemente. Apanhei-a a dissimular, a mentir, por causa duma coisa que até pode ser considerada ridícula. Não a confrontei. Não vale a pena. Ela sabe que me mentiu e eu também. Ficamos assim e tenho pena, porque a vida dá muitas voltas e os amigos deviam permanecer apesar dos pesares.
A profissão que tenho desenvolveu em mim um radar de mentirosos, e às vezes bem que gostava de o desligar.
Quando alguém que é amigo ou companheiro nos mente, talvez fosse melhor não dar por isso, não saber... Olhos que não vêem coração que não sente.
Há mais de uma década alguém foi dizer mal de mim à minha prima mais velha (por causa do meu mau feitio...). Não estávamos de boas relações, mas a minha prima conhecia-me bem e respondeu "A Teresa pode ter aquele feitio mas ela é aquilo que ali está. Receie em vez dela os lobos em pele de cordeiro."

segunda-feira, 16 de agosto de 2010

Perplexidade e dúvidas

No dia 30 de Junho passado teve lugar o exame nacional escrito de agregação. Quem ficar aprovado neste exame passa à última fase de avaliação: a prova oral.
Eu corrigi várias provas desse exame escrito, portanto sei que o prazo para entrega pelos correctores das provas corrigidas terminou no dia 26 de Julho.
As notas costuma(va)m ser publicadas uma ou duas semanas depois. Ora, decorridas entretanto três semanas, estranhei a falta de notícias.
Fui espreitar o site da OA e descobri isto.
Fiquei perplexa: o que justificará tal atraso na divulgação/publicação das notas, quando tanto as provas corrigidas como as pautas encriptadas estão, deduzo, com a CNA?
Saberão o CG e a CNA que da publicação das notas depende a progressão no estágio, a passagem à prova oral e finalmente a atribuição do título de Advogado?
Saberão o CG e a CNA que este atraso de meses na publicação das notas prolonga (desnecessariamente, digo eu) a duração do estágio e atrasa a entrada na profissão?
Se calhar, sabem...

domingo, 15 de agosto de 2010

Ausência

Eu deixarei que morra
em mim o desejo de amar os teus olhos que são doces
Porque nada te poderei dar senão a mágoa de me veres eternamente exausto.
No entanto a tua presença é qualquer coisa como a luz e a vida
E eu sinto que em meu gesto existe o teu gesto e em minha voz a tua voz.
Não te quero ter porque em meu ser tudo estaria terminado.
Quero só que surjas em mim como a fé nos desesperados
Para que eu possa levar uma gota de orvalho nesta terra amaldiçoada
Que ficou sobre a minha carne como nódoa do passado.
Eu deixarei... tu irás e encostarás a tua face em outra face.
Teus dedos enlaçarão outros dedos e tu desabrocharás para a madrugada.
Mas tu não saberás que quem te colheu fui eu, porque eu fui o grande íntimo da noite.
Porque eu encostei minha face na face da noite e ouvi a tua fala amorosa.
Porque meus dedos enlaçaram os dedos da névoa suspensos no espaço.
E eu trouxe até mim a misteriosa essência do teu abandono desordenado.
Eu ficarei só como os veleiros nos pontos silenciosos.
Mas eu te possuirei como ninguém porque poderei partir.
E todas as lamentações do mar, do vento, do céu, das aves, das estrelas.
Serão a tua voz presente, a tua voz ausente, a tua voz serenizada.


Vinicius de Moraes

sexta-feira, 6 de agosto de 2010

Rasgue-se o Estatuto!!

Nos termos do art. 30º do EOA, aprovado pela Lei 15/2005, de 26 de Janeiro, o Congresso dos Advogados Portugueses realiza-se, ordinariamente, de cinco em cinco anos, determinando o nº 2 do mesmo artigo que o Congresso é convocado pelo Bastonário com quatro meses de antecedência.
O VI Congresso realizou-se em Novembro de 2005, o que significa que, face à lei, o ano de 2010 devia ser ano de Congresso.
Porém, o Congresso ainda não foi convocado e daqui até ao fim do ano distam exactamente e apenas 4 meses...
Por outro lado, nos termos do nº 1 do art. 188º da mesma Lei, o estágio tem início, pelo menos, duas vezes em cada ano civil, em datas a fixar pelo Conselho Geral.
Ora, neste ano de 2010 ainda não teve início qualquer curso de estágio, nem está marcada data para o seu início (o 1º Curso de Estágio costuma ter início entre Março e Abril de cada ano). O que significa, na prática, que em 2010 haverá, no máximo, um curso de estágio. Por acaso ou sem ser, eu aposto que não vai haver curso nenhum, mas isso são outros quinhentos...
Resumindo, há pelo menos duas normas do EOA que foram pura e simplesmente ignoradas pelo Bastonário em exercício e pelo Conselho Geral.
Mas também o que é que isso interessa? Rasgue-se o Estatuto. Assim como assim, isto já está uma selva.
A propósito, as eleições estão marcadas para o dia 26 de Novembro de 2010...